Salesiano 26/08/24

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09/12/2011 18h44 - Atualizado em 11/12/2011 14h24

Representantes de trabalhadores rurais e Igreja se reúnem dia 21 com ministra da Casa Civil

Para entidades, o agronegócio pode atrapalhar a agroecologia na Chapada do Apodi

Por: Marcelo Lima

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O coordenador do Serviço de Apoio a Projetos Alternativos Comunitários (Seapac) da Arquidiocese de Natal, diácono Francisco Teixeira, informou que ainda este mês, na terça-feira (21), representantes da Igreja Católica e entidades de trabalhadores rurais se reunirão com a Ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. Na pauta, o projeto de irrigação da Chapada do Apodi.

A Igreja Católica publicou carta aberta em que critica o projeto de irrigação que vai desapropriar 13 mil hectares de terras de assentamentos rurais para ser viabilizado (veja a carta na íntegra no final desta reportagem).

De acordo como diácono Francisco Teixeira, a Igreja se posicionou em defesa dos mais pobres nesta discussão. Na opinião dele, o plano do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs) vai favorecer a instalação do agronegócio em detrimento dos pequenos agricultores que produzem na região há vários anos.

“Outro grande prejudicado seria o meio ambiente, porque onde está o agronegócio, está o agrotóxico também. Sabemos que o agronegócio, ele chega, explora por determinado tempo e deixa o ônus para os agricultores, principalmente os mais pobres que vivem da terra. O nosso diálogo vai ser no sentido de que o governo respeite a história desse povo que ali vive”, argumentou o diácono.

Na visão do representante da Igreja, nenhum percentual de terra deveria ser destinado para os grandes latifundiários. “Por que não trabalhar esse projeto com os assentados que precisam dessa colaboração, que precisam desse investimento? Por que eles têm ficar dependentes de uma empresa? Eles até então trabalham com autonomia”, questionou.

Representantes de agricultores temem que agroecologia não conviva com agronegócio

A Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Rio Grande do Norte (Fetarn) e Federação dos Trabalhadores em Agricultura Familiar do Estado (Fetraf-RN) também repudiam o projeto na forma como foi concebido.

Conforme o coordenador geral da Fetraf, João Cabral Lira, a instalação de latifundiários na Chapada do Apodi vai inviabilizar o desenvolvimento da agroecologia. “Nós temos a apicultura, nós temos a agroecologia, um projeto sustentável dos agricultores com manejo reconhecido em todo Brasil. Acho que isso é uma afronta ao que existe de desenvolvimento sustentável da agricultura familiar”, declarou.

O dirigente da Fetraf calcula que a medida do Dnocs pode prejudicar cerca de 250 famílias. O coordenador do Seapac, da Igreja, completa sobre a apicultura: “Onde tem agrotóxico, não tem abelha”.

Na opinião do diretor de finanças da Fetarn, Manoel Cândido da Costa, o mais surpreendente é a desapropriação de terras de assentamentos rurais. “O governo federal baixa um decreto para desapropriar terras que já foram desapropriadas pelo governo em função de ajudar essas famílias que lá foram assentadas”, disse. De acordo com Manoel da Costa, outros planos semelhantes para incentivar o agronegócio fracassaram no Estado e este não tem motivo para ser diferente. “Do Baixo-Açu, fizeram a primeira etapa e a segunda nunca fizeram, até porque não deu certo mesmo”, finalizou.

Tanto os representantes dos trabalhadores rurais, quanto o representante da Igreja concordam com um projeto para utilizar a água da barragem da Santa Cruz do Apodi, mas não no formato atual.

A equipe de reportagem do MERCADO ABERTO não conseguiu entrar em contato com o coordenador do Dnocs no Rio Grande do Norte, José Eduardo Alves.

Leia abaixo a carta aberta dos bispos do Rio Grande do Norte:

"Nota dos Bispos da Igreja Católica no Rio Grande do Norte sobre o Projeto de Irrigação do DNOCS para a Chapada do Apodi

A Igreja Católica no Rio Grande do Norte, ao tomar conhecimento do Projeto de irrigação que o DNOCS deseja implantar na Chapada do Apodi, amparado pelo Decreto Nº 0-001 de 10 de Junho de 2011, que torna de utilidade pública 13.855,13 hectares para fins de desapropriação, vem, através de seus Bispos, manifestar a sua preocupação acerca da implementação do referido Projeto.

Todos somos sabedores que, naquela região, se concentram as principais experiências de agroecologia e produção de alimentos da Agricultura Familiar Camponesa do nosso Estado. Essa realidade nos interpela para a consciência de se preservar o modo de viver destas comunidades, bem como a sadia qualidade de vida dessas famílias e do meio ambiente, sem interferir em suas práticas culturais e socioambientais.

Sabemos da grande importância do aproveitamento das águas da Barragem de Santa Cruz do Apodi, garantindo, em primeiro lugar, o abastecimento humano de todas as comunidades rurais e urbanas da região, como também na utilização para a produção de alimentos saudáveis, sem uso de agrotóxico, geração de emprego, renda, segurança e soberania alimentar para as famílias de agricultores/as familiares.

Após diálogo com as famílias na região, movimentos sociais, serviços e pastorais sociais da Igreja Católica, que há muitos anos atuam na Chapada do Apodi, compreendemos que a proposta de projeto defendida pelo DNCOS trará enormes prejuízos aos agricultores familiares ali residentes, pois terão de deixar suas casas e as terras, onde vivem há mais de um século, praticando agricultura baseada na agroecologia, para dar lugar a um grupo de empresas cujo modelo de produção baseia-se na monocultura e no uso intensivo de agrotóxico que, como sabemos, contamina a água, a terra e o ar, com consequências graves diretas na saúde das pessoas e no meio ambiente.

Lamentavelmente, ao alimentar esse padrão de desenvolvimento, o atual governo inviabiliza a justa prioridade que atribuiu ao combate à miséria em nosso país, tendo como eixo estruturante o crescimento econômico pela via da exportação de commodities. Esse padrão gera efeitos perversos que se alastram em cadeia sobre a nossa sociedade.

Na Chapada do Apodi, a expressão mais visível da implantação dessa lógica econômica é a expropriação das populações de seus meios e modos de vida, acentuando os níveis de degradação ambiental, da pobreza e da contínua dependência desse importante segmento da sociedade potiguar às políticas sociais compensatórias.

Não temos dúvidas de que esse modelo, aqui adotado desde o início de nossa formação histórica, ganhou forte impulso nas últimas décadas com o alinhamento dos seguidos governos aos projetos expansivos do capital. Materialmente, ele se ancora na expansão do hidro agronegócio e em grandes projetos de infraestrutura implantados para favorecer a extração e o escoamento de riquezas naturais para os mercados globais.

A Igreja Católica, à luz de sua doutrina social, entende que a implantação de um projeto desta magnitude não pode ser motivada por uma lógica meramente econômica e produtivista, que não leva em consideração a proteção da vida humana e da sociobiodiversidade. Não temos o direito de subordinar a agenda do bem viver das comunidades campesinas à agenda econômica do modo de produção e consumo vigente.

Neste momento, como pastores do Povo de Deus, que está sob o nosso cuidado pastoral, somos chamados a ser solidários aos agricultores/as familiares da Chapada do Apodi e a sensibilizar o Governo Federal para REVOGAR o Decreto Nº 0-001 de 10 de Junho de 2011 e abrir diálogo na construção de novo projeto com os recursos já disponibilizados no PAC, que seja capaz de integrar a Chapada e Vale do Apodi visando fortalecer a agricultura familiar camponesa de base agroecologica, incluindo todos os assentamentos que estão nesta região.

Por fim, pedimos que Nossa Senhora da Apresentação, a Senhora Santana e Santa Luzia, padroeiras de nossas dioceses, intercedam junto a Deus para iluminar nossos governantes, para que promovam o bem comum, a paz e a justiça socioambiental.
 

Natal-RN, 05 de dezembro de 2011

Dom Matias Patrício de Macedo 

Arcebispo Metropolitano de Natal

Dom Mariano Manzana

Bispo de Mossoró

 

Dom Manoel Delson Pedreira da Cruz 

Bispo de Caicó

Dom Heitor de Araújo Sales

Arcebispo Emérito de Natal

Presidente do Seapac"


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