Já faz algum tempo que os brasileiros descobriram as vantagens de participar nos programas de fidelização (mais comumente chamados de “programas de milhagem'') de companhias aéreas, operadoras de cartões de crédito e redes de hotéis. Quando a extinta VARIG lançou o programa Smiles, em 1994, o panorama da aviação nacional era bem diferente: preços regulados pelo governo, número reduzido de passageiros domésticos e alta concentração do setor. Avance 20 anos e o cenário atual inclui aeroportos (e aviões) abarrotados, serviços cada vez mais esparsos e um mercado um pouco menos concentrado — atestados da popularização do transporte aéreo no Brasil e no mundo.
Os programas de milhagem seguiram a tendência e também se popularizaram: o Multiplus Fidelidade, da TAM, conta com mais de 12 milhões de associados, enquanto o Smiles tornou-se o programa frequente da Gol após o colapso da VARIG e possui mais de 9 milhões de clientes.
Os programas de milhagem são excelentes ferramentas de marketing para as companhias aéreas mas geram um enorme passivo para estas empresas na forma de milhas acumuladas e ainda não utilizadas ou vencidas. Conforme esse passivo aumenta, as companhias procuram modos de desvalorizá-lo, geralmente tornando os prêmios mais caros e forçando os participantes a “gastar” mais para conseguir um bilhete grátis.
A tendência é mundial, mas TAM e Gol levaram essa cartilha a novos extremos ao longo de 2013 e 2014, hiperinflacionando suas tabelas de prêmio a tal ponto que passaram a estar desalinhadas com a média de valores cobrados por companhias internacionais.
A TAM eliminou em 2013 a garantia de trechos prêmio por 10 mil pontos nos voos domésticos e na América do Sul – um dos grandes diferenciais do programa até então – e instituiu um sistema flexível, passando a cobrar entre 5 mil e 50 mil pontos por voo. Esse mesmo sistema passou a valer também para as demais rotas da empresa: voos em classe econômica para os EUA custam atualmente entre 25 mil e 115 mil pontos por trecho (ante 20 mil e 30 mil pontos básicos anteriormente), enquanto os voos para a Europa saltaram para entre 30 mil e 130 mil pontos (antes, estas rotas tinham valores básicos que variavam de 30 mil a 40 mil pontos por voo).
Em agosto deste ano foi a vez da Gol instituir mudanças no Smiles. Na classe econômica, nos voos saindo do Brasil, a mudança mais notável foi o aumento do valor cobrado nos trechos rumo aos EUA, que passaram de 25 mil para 35 mil milhas. Já na classe executiva, o salto em alguns casos foi chocante: o trecho entre Brasil e EUA subiu de 37,5 mil para 85 mil milhas (aumento de 126,7%). O novo valor de 85 mil milhas também passou a valer para trechos em classe executiva entre o Brasil e a Europa (antes eram 52,5 mil milhas — o aumento foi de 61,9%) e entre a Europa e a África (30 mil milhas antes da mudança, um aumento de 183% no valor cobrado).
Como se não bastasse a escalada no valor dos prêmios, os clientes dos dois principais programas de milhagem nacionais ainda precisam conviver com a baixa qualidade no atendimento (não é incomum passar mais de 40 minutos ao telefone para que se consiga falar com um agente do Smiles ou do Fidelidade), além da notória dificuldade para se encontrar assentos disponíveis.
Programas Estrangeiros
Diante do cenário pouco animador, os programas de companhias aéreas estrangeiras tornam-se cada vez mais alternativas convidativas para o passageiro brasileiro.
Eis alguns dos principais atrativos de programas internacionais:
1- MILHAS QUE NÃO EXPIRAM NUNCA
Na maior parte dos programas aéreos americanos e britânicos as milhas nunca vencem desde que haja qualquer tipo de movimentação na conta do participante a cada 18 meses (nos programas brasileiros é praxe que as milhas tenham validade de dois ou três anos). Isso é uma enorme vantagem para quem voa pouco mas, por exemplo, usa cartão de crédito filiado a empresas aéreas para juntar pontos. Os programas operados por American Airlines, British Airways, Delta Airlines e United Airlines, todos possuem milhas com validade indeterminada.
2- MILHAS EM FAMÍLIA
Que tal somar gratuitamente todas as milhas de até sete membros de sua família e que residam em um mesmo endereço? No Executive Club, da British Airways, isso é possível através das contas familiares. Alguns outros programas de empresas aéreas árabes e europeias também permitem a utilização de contas conjuntas, mas de maneira um pouco mais restritiva que o Executive Club. Este tipo de conta agiliza muito o processo de obtenção dos pontos necessários para o resgate de um prêmio.
3- ATENDIMENTO ÁGIL
Não é segredo que empresas brasileiras na maioria dos setores possuem atendimento ao cliente bastante deficiente. Não é diferente entre as companhias aéreas. Para quem está acostumado a lidar com agentes mal treinados e com pouca autonomia para resolver problemas ou reconhecer erros da própria empresa chega a ser um alívio lidar com agentes dos grandes programas internacionais: além de evitar horas ao telefone e questões simples costumam ser resolvidas quase imediatamente. As maiores companhias aéreas com operações no Brasil, como American Airlines, Air France, British Airways, Delta, Lufthansa e United Airlines possuem times especializados em seus programas de milhagem que falam português. Para as demais empresas é útil saber se comunicar em inglês ou espanhol nos contatos com o call center internacional.
4- TABELA DE PRÊMIOS COMPETITIVA
Mesmo com a tendência mundial de subida nos valores dos bilhetes prêmio, grande parte dos preços de prêmios de companhias internacionais ainda é bastante vantajosa na comparação com as atuais tabelas praticadas por TAM e Gol. Além disso, muitas das empresas internacionais possuem acordos com TAM, Gol e Azul, ou seja, é possível que você acabe pagando menos em uma companhia parceira para voar em empresas brasileiras. Alguns exemplos:
Do Brasil para os EUA em classe econômica (por trecho):
American Airlines (voando com American Airlines, TAM ou US Airways): 20 mil milhas (baixa temporada) ou 30 mil milhas (alta temporada).
British Airways (voando com American Airlines, TAM ou US Airways): 20 mil, 25 mil ou 30 mil milhas, em voos diretos, dependendo da distância do voo.
Gol (voando Gol com escala ou voos diretos com a Delta Airlines): 35 mil milhas.
TAM (voando com American Airlines , TAM ou US Airways): de 25 mil a 115 mil pontos em voos TAM, 35 mil pontos em voos da American Airlines ou US Airways.
United Airlines (voando com Avianca Colombia, Copa Airlines, United Airlines e, a partir de dezembro, com a Azul): 30 mil milhas.
Do Brasil para a Austrália em classe executiva (por trecho):
American Airlines (voando com TAM, LAN ou QANTAS, via Chile): 50 mil milhas.
British Airways (voando com TAM, LAN ou QANTAS, via Chile): 120 mil milhas.
Gol (voando Delta Airlines, via EUA, ou Qatar Airways, via Doha): a partir de 100 mil milhas (a empresa não divulga os valores máximos).
TAM (voando com TAM, LAN ou QANTAS, via Chile): 165 mil milhas (a empresa soma os valores das conexões entre continentes, são 55 mil pontos até o Chile e outros 110 mil pontos até a Austrália).
United Airlines (voos com a própria United, via EUA, ou com outras dez parceiras via África, Europa e Ásia): 72,5 mil milhas em voos United e 82,5 mil milhas em empresas parceiras.
5- ACUMULE MILHAS COM A GOL E A TAM EM UM MESMO PROGRAMA
Pode parecer difícil mas é possível acumular milhas voadas com Gol e TAM em um único programa. Isso ocorre porque ambas empresas mantêm parcerias simultaneamente com a Iberia e com a Qatar Airways. A Iberia mantém o programa Iberia Plus, enquanto a Qatar opera o Privilege Club. Membros desses programas acumulam em uma única conta os trechos voados em ambas as companhias brasileiras.
Desvantagens
Não existe programa perfeito e há percalços mesmo com os melhores programas internacionais:
1- DIFICULDADE EM ACUMULAR MILHAS
Se você mora no Brasil, inevitavelmente será mais fácil acumular pontos com parceiros não aéreos nos programas nacionais. Tanto Gol quanto TAM possuem parcerias com lojas, bancos, escolas, editoras, restaurantes e postos de gasolina — as estrangeiras não possuem essa rede ampla em território nacional e se você junta a maior parte dos seus pontos com esses serviços certamente não será vantajoso mudar.
2- FOCO ESTRANGEIRO
Ao contrário das empresas nacionais, que possuem prêmios atrativos e promoções para voos domésticos ou voos curtos na América do Sul, o foco das estrangeiras tende a ser sua região sede. Isso significa, que talvez você encontre excelentes promoções e descontos em voos a partir da Europa ou dos EUA, mas tenha que desembolsar mais por prêmios dentro do Brasil.
3- LÍNGUA
As grandes empresas internacionais possuem call centers no Brasil com agentes que falam português, mas nas empresas menores ou em alguns casos mais complexos, apesar do número de telefone local, você pode acabar tendo mais facilidades falando diretamente com a central internacional, o que geralmente exige o domínio do inglês ou do espanhol.
4- PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR
No caso de empresas estrangeiras, as regras dos programas de milhagem não obedecem ao Código de Defesa do Consumidor (mas nas transações realizadas no Brasil, a lei brasileira se aplica).
O melhor programa para você
O perfil do passageiro determina o programa mais adequado. Para quem voa pouco, mas junta pontos através de cartões de crédito e pretende viajar para o exterior, os programas estrangeiros tendem a ser a melhor opção. A American Airlines possui parceria no Brasil com o Citibank para a emissão de cartões de crédito, já a Iberia é parceira do Banco Santander no país. Portadores de cartões American Express podem transferir milhas para dezenas de parceiras brasileiras e internacionais.
Se você ganha a maior parte dos seus pontos em restaurantes, compras online ou abastecendo o carro, ou ainda se você pretende viajar principalmente pelo Brasil ou pela América do Sul, vale mais a pena ser associado a um programa nacional. Escolha a companhia aérea com a qual você voa mais frequentemente ou que tenha parceria com os serviços que você mais utiliza.
Passageiros com perfil misto, que não voem com muita frequência devem priorizar o programa que lhes permitirá juntar o maior número de milhas com a maior rapidez — evite acumular as milhas por períodos muito longos de tempo mesmo que elas não estejam próximas do vencimento. A qualquer momento tabelas de prêmio podem mudar, parcerias podem ser desfeitas e rotas podem ser canceladas: esperar demais pode significar não conseguir emitir o prêmio planejado.
*Fonte: UOL